Impeachment de Fernando Collor | |
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Fernando Collor deixa a presidência. | |
Acusado | Fernando Collor de Mello |
Período | 29 de setembro de 1992 a 29 de dezembro de 1992 |
Situação | Concluído pelo impedimento do mandato em 29 de dezembro de 1992 Consequências: perda dos direitos políticos por 8 anos de Collor e posse do vice-presidente Itamar Franco |
Acusações | Crime de responsabilidade |
Votações | |
Votação na comissão da Câmara | |
Placar | 16 votos favoráveis 5 votos contrários |
Resultado | Aprovado |
Votação no plenário da Câmara dos Deputados | |
Placar | 441 votos favoráveis 38 votos contrários 1 abstenção 23 ausentes |
Resultado | Aprovado |
Votação na comissão do Senado Federal | |
Placar | 32 votos favoráveis 1 voto contrário 1 abstenção |
Resultado | Aprovado |
Votação no plenário do Senado Federal | |
Placar | 76 votos favoráveis 3 votos contrários |
Resultado | Aprovado |
O processo de impeachment de Fernando Collor transcorreu no final de 1992 e foi o terceiro processo de impeachment do Brasil (em 1955 os presidentes Carlos Luz e Café Filho também sofreram processos de impeachment), resultando no afastamento definitivo de Fernando Collor de Mello do cargo de presidente da república. O processo, antes de aprovado, fez com que Collor renunciasse ao cargo em 29 de dezembro de 1992,[1] deixando o cargo para seu vice Itamar Franco. Mesmo assim, o processo continuou e os parlamentares se reuniram em plenário para a votação do impeachment e decidiram que o presidente não poderia evitar o processo de cassação pela apresentação tardia da carta de renúncia. Com o julgamento, Collor ficou inelegível por 8 anos. Collor foi acusado de corrupção pelo seu próprio irmão, Pedro Collor de Mello, em matéria de capa da revista Veja, em 1992.
O empresário Paulo César Farias, tesoureiro de campanha de Collor, foi a personalidade-chave do impeachment. Ele seria o testa de ferro em diversos esquemas de corrupção divulgados de 1992 em diante. A investigação do Esquema PC Farias mostrou que o artifício ilegal usado pelos envolvidos arrecadou cerca de 15 milhões de reais durante o governo de Fernando Collor, sendo que mais de um bilhão de reais chegou a ser movimentado nos cofres públicos.[2] Nenhuma destas contribuições teve qualquer ligação com benefício ao "cliente" de Paulo César por conta de favor prestado por Fernando Collor. O "esquema PC" movimentou mais de US$ 1 bilhão dos cofres públicos.[3]
Em 1989, depois de 29 anos da eleição direta que levou Jânio Quadros à presidência da república, o carioca Fernando Collor de Mello (PRN-AL) foi eleito por pequena margem de votos (42,75% a 37,86%) sobre Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), em campanha que opôs dois modelos de atuação estatal: um pautado na redução do papel do Estado (Collor) e outro de forte presença do Estado na economia (Lula).
A campanha foi marcada pelo tom emocional adotado pelos candidatos e pelas críticas ao governo de José Sarney. Collor se autodenominou "caçador de marajás", que combateria a inflação e a corrupção, e "defensor dos descamisados". Lula, por sua vez, apresentava-se à população como entendedor dos problemas dos trabalhadores, notadamente por sua história no movimento sindical.
Nos primeiros 15 dias de mandato, Collor lançou um pacote econômico que levou o seu nome e que bloqueou o dinheiro depositado nos bancos (caderneta de poupança e contas correntes) de pessoas físicas e jurídicas (confisco). Entre as primeiras medidas para a economia, houve uma reforma administrativa que extinguiu órgãos e empresas estatais e que promoveu as primeiras privatizações, abertura do mercado brasileiro às importações, congelamento de preços e prefixação dos salários.
Embora inicialmente tenha reduzido a inflação, o plano trouxe a maior recessão da história brasileira, até então, resultando no aumento do desemprego e nas quebras de empresas. Aliado ao plano, o presidente imprimia uma série de atitudes características de sua personalidade, que ficou conhecida como o "jeito Collor de governar".
Era comum se assistir a exibições de Collor fazendo cooper, praticando esportes, voando em caças da Força Aérea Brasileira e subindo a rampa do Palácio do Planalto, comportamentos estes que exaltavam suas supostas jovialidade, arrojo, combatividade e modernidade. Todos expressos em sua notória frase "Tenho aquilo roxo".
Por trás do jeito Collor, montava-se um esquema de corrupção e tráfico de influência que veio à tona em seu terceiro ano de mandato.
Em reportagem publicada pela revista Veja, na sua edição de 13 de maio de 1992, Pedro Collor de Mello acusava o tesoureiro da campanha presidencial de seu irmão, o empresário PC Farias, de articular um esquema de corrupção de tráfico de influência, loteamento de cargos públicos e cobrança de propina dentro do governo.
O chamado "esquema PC" teria, como beneficiários, integrantes do alto escalão do governo e o próprio presidente. No mês seguinte, o Congresso Nacional instalou uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o caso. Durante o processo investigatório, personagens como Ana Acioli, secretária de Collor, e Francisco Eriberto, seu ex-motorista, prestaram depoimento à comissão confirmando as acusações e dando detalhes do esquema.
Um dos expedientes utilizados por PC era abrir contas "fantasmas" para realizar operações de transferência de dinheiro arrecadado com o pagamento de propina e desviado dos cofres públicos para as contas de Ana Acioli. Além disso, gastos da residência oficial de Collor, a Casa da Dinda, eram pagos com dinheiro de empresas de PC Farias.
Aprovado por 16 votos a 5, o relatório final da comissão constatou, também, que as contas de Collor e PC não haviam sido incluídas no confisco de 1990. Foi pedido, então, o impeachment do presidente.
Em agosto, durante os trabalhos da comissão, a população brasileira começou a sair às ruas para pedir o impeachment. Com cada vez mais adeptos, os protestos tiveram, como protagonista, a juventude, que pintou no rosto o "Fora Collor" (com um "l" verde e o outro amarelo) e o "Impeachment Já": era o movimento dos "caras-pintadas".
Em votação aberta, após tentativa de manobra do presidente para uma sessão secreta, os deputados votaram pela abertura de processo de impeachment de Collor. Foram 441 votos a favor (eram necessários 336), 38 contra, 23 ausências e uma abstenção.
Collor renunciou ao cargo, mas, com o processo já aberto, teve seus direitos políticos suspensos por oito anos, até 2000.
Após seu impeachment, assinou carta para a população afirmando que saiu da presidência com consciência limpa e que foi vítima de perseguição política.[4] Menos de duas horas depois, reuniu-se em um churrasco na Casa da Dinda com nomes como Ricardo Fiuza, Lafaiete Coutinho, Álvaro Mendonça, Odacir Soares, Gilmar Mendes, José Guilherme Villela, Arthur Castilho, Paulo Octávio, Luiz Estevão e Marcos Coimbra para preparar sua defesa no senado.[5]
Durante o processo, Collor chegou a pedir asilo em Portugal.[6]
Fernando Collor ingressou no Superior Tribunal de Justiça visando a reaver os seus direitos políticos, preservados, conforme argumentou, pelo fato de que sua renúncia ocorreu antes de aberta a sessão que decidiu pela condenação. Mas, em dezembro de 1993, esse tribunal manteve-o inelegível e inapto ao exercício de cargos e funções públicas por entender que a renúncia apresentada à undécima hora não passara de um "ardil jurídico". Entretanto, em julgamento realizado um ano depois, o Supremo Tribunal Federal arquivou o processo contra Collor e PC Farias, acusados do crime de corrupção passiva (placar de 5 a 3).[7][8] Porém, Collor manteve-se inelegível, tendo seu pedido para concorrer nas eleições de 1998 rejeitado pelo STF.[9]
Na ação penal 307, em 1994, Collor foi julgado com mais oito pessoas (entre os quais PC Farias, seu então tesoureiro) pelos crimes de corrupção passiva, corrupção ativa, supressão de documentos e falsidade ideológica.[10]
Collor respondeu pelo crime de corrupção passiva (quando funcionário público recebe vantagem indevida) por ter, supostamente, se beneficiado do cargo de presidente da república. Na acusação, a Procuradoria-Geral da República afirmou que o ex-presidente utilizara contas fantasmas para receber, diretamente de empresas ligadas a PC Farias, 4 724 593,99 dólares estadunidenses. Collor argumentou que o dinheiro era fruto de restos de gastos de campanha. Depois, disse que os recursos haviam sido obtidos através de um empréstimo no Uruguai.
O Supremo Tribunal Federal absolveu Collor das acusações de corrupção baseando-se numa tecnicalidade, citando falta de provas que o ligassem ao esquema de PC Farias. Uma evidência considerada como crucial foi desconsiderada pelo tribunal após ter sido classificada como obtida ilegalmente, durante uma busca e apreensão policial sem mandado ou pedido judicial de interceptação telefônica: uma gravação de conversa telefônica e disquetes de computador pessoais de PC. Outras evidências coletadas a partir das informações extraídas dos arquivos armazenados no computador de PC também foram anuladas, após a equipe jurídica de Collor invocar, com sucesso, a doutrina dos frutos da árvore envenenada.[11]
Outro problema na acusação do procurador-Geral da República na época, Aristides Junqueira, estava relacionada à falta de um "ato de ofício" perpetrado pelo ex-presidente. Na prática, o entendimento dos ministros é que esse crime somente poderia ser configurado na época quando houvesse a comprovação de antecipação, omissão ou retardamento de ato funcional em virtude de uma vantagem recebida. Nos autos, isso não ficou devidamente comprovado.[12]
Em 2007, Collor lança o livro "Resgate da História— A verdade sobre o processo do impeachment", elencando questionamentos da legalidade dos critérios políticos e da judicialização sobre o processo e apontando que o mecanismo jurídico tem sido construído com imperfeições e (ou) arrogos tanto de políticos como de anônimos em busca de notoriedade: "Pedidos de impeachment contra os presidentes da República transformaram-se numa atividade rotineira em nosso presidencialismo. Todos os chefes de Governo sob a Constituição de 1946, à exceção do marechal Dutra e do presidente Jânio Quadros, e todos os demais, depois do fim do regime militar (Sarney, Itamar Franco, FHC e Lula), foram objeto desse procedimento, alguns subscritos por parlamentares, outros por anônimos em busca de notoriedade".[13]